segunda-feira, 25 de junho de 2012

Em busca de histórias perdidas

Hugo Viana

















No livro "Bonsai" (Cosac Naify, 64 páginas, R$ 23), o escritor chileno Alejandro Zambra, 35 anos, parece aplicar na escrita técnicas de jardinagem, mais ou menos como um paisagista que poda palavras em busca de um texto ideal. É uma história curta feita de poucos trechos essenciais, sugerindo o velho aforismo que "escrever é cortar palavras". 

"Bonsai" é uma história de amor, ou talvez sobre o fim do amor, como os grandes romances trágicos. Não há surpresa nessa revelação; Zambra adianta, já na primeira frase do livro: "No final ela morre e ele fica sozinho", terminando o parágrafo com "O resto é literatura", marcando dessa forma o curioso início de sua investigação através da escrita. 



São dois estudantes de literatura, Emilia e Julio, que se conhecem durante uma suposta noite de estudos para uma prova de Sintaxe Espanhola II na casa de colegas em comum; mas um amigo chamou outro, alguém disse que costumava estudar ouvindo música, outro comentou que era difícil se concentrar sem vodca, e então às 3h completamente bêbados Emilia e Julio dormiram juntos no quarto da empregada. Começa aí uma sensível e também um tanto amarga história de amor, como em geral acontece em livros excepcionais.

Esta primeira frase parece demonstrar uma relativa falta de interesse pela história no sentido tradicional, uma certa apatia em relação ao que "acontece no fim", sugerindo uma vontade de reforçar que é a escrita, o trato com as palavras, que promove a permanência de livros na história. É esse o texto de Zambra, virtuosamente discreto e ao mesmo tempo encantador com poucas palavras.

Nesta narrativa de mistério final esclarecido na primeira frase, Zambra dedica atenção aos personagens, aos modos que os constituem. É realmente notável a habilidade do autor para em poucas páginas conseguir empatia, toque fundamental nesta história. Zambra escreve sobre primeiros amores de seus personagens, momentos que flagram alguma insegurança ou orgulho, e a impressão é de intimidade, de falar sobre convenções de uma época.

Essa ideia vem rapidamente com a descrição do estado emocional de uma geração a partir desses dois personagens; com um texto ao mesmo tempo humorado e delicado, Zambra explora situações quando um casal está se conhecendo, quando dividem a cama com hábitos curiosos ou acordam com livros perdidos entre as cobertas, e também como meio inevitavelmente se afastam.

Além de escritor Zambra é crítico e professor de literatura, e neste livro ele parece demonstrar um certo fascínio por livros, colocando no enredo citações a grandes autores, especialmente Marcel Proust (o livro "Em Busca do Tempo Perdido") e Macedonio Fernández, sendo os trabalhos desses escritores artifícios especiais para o desenvolvimento do enredo. Talvez a proximidade com a história literária e os mecanismos de escrita tenha gerado em Zambra o efeito conciliador de entender a literatura não apenas como um meio para criar narrativas, mas também como uma forma de emocionar através de técnicas criativas.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

11. Grandes escritores sem tradução

Hugo Viana


Tirando um pouco a poeira do blog depois de um mês de férias, escrevo sobre lacunas no mercado editorial brasileiro, grandes autores que são lembrados como clássicos em outros países mas relativamente pouco conhecidos no Brasil. Um deles é James Thurber (1894-1961), escritor norte-americano que tem apenas dois livros traduzidos para nosso idioma (ele escreveu mais de vinte), ambos esgotados. Thurber trabalhou na redação da cultuada revista The New Yorker por mais de 30 anos, sendo reconhecido especialmente por seus textos bem humorados e desenhos comicamente simples e engraçados. Thurber é um tipo especial de humorista, um comediante que se coloca sem esforço ou exagero como alvo da piada. Parte considerável de sua criação é uma espécie de auto-biografia inventada, obras como “My Life and Hard Times” (em tradução livre, minha vida e tempos difíceis), em que o autor escreve em primeira pessoa sobre infância e juventude e coloca personagens reais (em geral familiares) em situações cômicas distorcidas pelos métodos da ficção. Seus textos são quase sempre curtos e parecem conter nessa brevidade a capacidade de transformar caprichos do cotidiano em comédia exemplar. O que parece colocar Thurber num lugar especial na literatura norte-americana é sua maneira pessoal de usar o humor para resgatar comentários sobre a complicada natureza humana e a vida em sociedade. Interessante também procurar livros de Thurber em inglês, já que certos trechos seriam radicalmente diferentes se traduzidos para outra língua.