quarta-feira, 3 de abril de 2013

História de amor e ódio familiar


Hugo Viana*


foto: Bruno Tetto

CURITIBA (PR) – Renata Sorrah, conhecida atriz global, juntou-se ao grupo curitibano Companhia Brasileira de Teatro no espetáculo “Esta criança”, baseado em texto do dramaturgo francês Joël Pommerat, encenado domingo à noite, na 22ª edição do Festival de Teatro de Curitiba. 

“É um trabalho libertador”, disse Renata, em conversa com a imprensa na manhã de domingo. “A TV me deu fama, mas eu nunca vesti essa fama. Gosto de trabalhar com pessoas que me identifico. Vi deles a peça ‘Vida’ e me tocou profundamente, me fez acreditar no teatro de novo. ‘Esta criança’ nos afetou, é uma peça em que as pessoas se reconhecem, pois se não são pais, são filhos”, ressaltou a atriz.

Embora o espetáculo tenha gerado risos, é um intenso drama familiar. A peça é dividida em dez fragmentos, cenas conectadas pelo tema, a família, a relação entre pais e filhos. Em pouco mais de 70 minutos, os atores encenam, em diferentes enredos, o momento exato em que as pessoas perdem o conforto da razão, chutam a porta e gritam com raiva toda amargura gerada pelo desgaste familiar.

Nesse sentido é uma peça de extremos; histórias envolvendo brigas e acusações, sem no entanto o trabalho gradual de uma dramaturgia que torne essa explosão complexa. O interesse é observar a fúria, o que é protestado na embriaguez da raiva, e não investigar a situação emocional que leva ao descontrole (e o que acontece depois do desespero). 

Essa estrutura fragmentada sugere a aparência de uma peça preenchida por vazios, um espetáculo dedicado inteiramente a observar um único ponto de vista na relação familiar, o momento em que as pessoas perdem o controle. Os personagens não têm nome, são apenas pais, mães, filhos e filhas devastados pela percepção de que as pessoas mais amadas podem também machucar. 

Um aspecto negativo da peça é de certa forma uma certa tendência curiosa do teatro nacional. O texto é sempre superior ao ator; a palavra escrita tem a identidade da literatura, e não da linguagem que se acomoda ao perfil de quem fala. Personagens de origens humildes falam com os mesmos termos que psicólogos usariam durante grande descoberta. 

Não parece existir o personagem autônomo: há apenas o texto a ser falado em voz alta, sem particularidades. São quatro bons atores (além de Renata, estão no palco Giovana Soar, Ranieri Gonzalez e Edson Rocha), profissionais que se entregam com paixão aos enredos curtos, mas que não vão além da palavra escrita. Numa peça que coloca as relações familiares no tom do realismo, esse parece um problema incômodo. 

HISTÓRIA

A Companhia Brasileira de Teatro começou sua trajetória no fim de 1999, com a peça “Volta ao dia”, baseada em texto do escritor argentino Julio Cortázar. Desde então, o grupo encenou outras dez peças. “Temos inquietações que ainda persistem, obsessões que estão no fundo do grupo e se transformam, trazem as bases do nosso pensamento sobre teatro”, explicou Marcio Abreu, diretor da Cia. “As peças são apenas a ponta do iceberg.”

*Jornalista viajou a convite do festival


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