quarta-feira, 3 de abril de 2013
Humor e reflexão social nos palcos
Hugo Viana*
foto: Lina Sumizono/Divulgação
CURITIBA (PR) - Durante o 22º Festival de Teatro de Curitiba a cidade parece se envolver com as artes cênicas, interessada na possibilidade de satisfação, lotando teatros e dialogando com intervenções urbanas organizadas pelo evento. No primeiro fim de semana do Festival, a programação contemplou forças opostas no mercado: peças de companhias pouco conhecidas e espetáculos com atores globais.
Uma das atrações mais aguardadas era “A arte e a maneira de abordar seu chefe para pedir um aumento”, peça dirigida por Guel Arraes (de “O auto da compadecida” e “Lisbela e o prisioneiro”), um monólogo interpretado por Marco Nanini, baseado em texto do escritor francês Georges Perec (1936-1982), autor que observou os mecanismos da vida em sociedade e os modos de influência da rotina no comportamento.
O espetáculo, apresentado no Teatro Marista (parecido com o Teatro da UFPE), é como uma palestra de auto-ajuda: Nanini atua no papel de um empresário que relata a jovens trabalhadores como conseguir um aumento. O roteiro é baseado em variáveis: como agir se o chefe está ou não na sala; se convida ou não para entrar; se oferece ou não uma cadeira.
O espetáculo, então, é feito de digressões: o enredo não é uma história linear, uma narrativa que descreve o trajeto de um homem comum em busca do aumento em tempo real, e sim uma combinação aleatória de possibilidades, desvios, retornos, um jogo de probabilidades.
A ironia do espetáculo remete ao cineasta francês Jacques Tati (1907-1982), que, em 1967, dirigiu dois filmes sobre o mundo impessoal das corporações, o longa “Playtime” e o curta-metragem “Curso noturno”. De Tati, Guel Arraes parece incorporar o humor sobre burocracia empresarial e a pequenez do homem comum diante da instituição. A interpretação de Nanini, excelente em cena, também remete à maneira desajeitada de Hulot, personagem icônico de Tati (destaque também para a iluminação, que modifica o único cenário e sugere sentimentos de acordo com a cena).
Embora a peça tenha uma ótima ideia, uma ironia sobre modos contemporâneos, obsessões que afastam as pessoas de felicidades possíveis, parecem existir problemas de roteiro: as piadas se repetem, reiteração que tem como conceito afirmar o labirinto cíclico das corporações, mas que, na prática, no palco, gera cada vez menos risos. É como se diante de tantas possibilidades criativas, enredos de humor que poderiam surgir nos temas “aumento” e “trabalho”, o roteiro se dedicasse apenas a duas ou três ideias, girando em torno dos mesmos tópicos durante uma hora.
*Jornalista viajou a convite do festival
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