segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Família e fé no cinema nacional
















Hugo Viana*

BELO HORIZONTE (MG) - Os filmes brasileiros que chegam às salas de cinemas parecem não representar a complexa e vasta geografia da cinematografia nacional; são filmes em geral bancados por grandes produtoras, enquanto obras independentes ainda procuram chance para entrar (e permanecer) em cartaz no circuito exibidor.

A real oportunidade para descobrir o que vem sendo filmado no Brasil parece ser em festivais de cinema. A 6ª edição da Mostra de Cinema de Belo Horizonte (Cine BH) mostrou, no sábado à noite, dois filmes nacionais recentes que, em hipóteses otimistas, terão poucas sessões em salas de cinema alternativo.

Apesar de "Éden" (RJ), de Bruno Safadi, e "Cru" (DF), de Jimi Figueiredo, não serem exemplares excepcionais de cinema, são filmes que trabalham perspectivas diferentes de narração e estilo, obras dirigidas por cineastas que superam técnicas que pelo uso excessivo viraram uma espécie desgastada de regra.

Curiosamente são filmes ligados por um interesse de observar classes menos favorecidas, a influência da moral religiosa no cotidiano e assim reformular pecados do passado, mas sem ressaltar a pobreza ou a fé como marca decadente, e sim como impulso para mudanças. São personagens movidos pela crença em algo, movimento que tem pulsões de morte e vida.

Em "Éden" Bruno Safadi narra a história de uma mulher grávida de oito meses (Leandra Leal) que perde o marido, assassinado. O vazio gera questionamentos sobre o motivo da existência e a faz procurar algum tipo de consolo na religião. Lá é acolhida por um pastor (João Miguel), figura misteriosa, popular mas ao mesmo tempo ambiciosa.


Safadi tem um discurso relativamente ambíguo; parece ao mesmo tempo respeitar a igreja como possibilidade de assistência emocional e propor ironicamente que é uma instituição que, como uma empresa de capital forte, necessita em primeira mão dominar o mercado.

O filme tem forte carga emocional, tratando o frágil estado sentimental da protagonista como uma espécie de filme de terror; o drama de gerar vida ao mesmo tempo em que a morte assombra é filmado como pesadelo sem fuga aparente. Surge então a dúvida: a salvação está na crença em uma força superior ou no próprio homem?

Ao mesmo tempo em que explora diferentes rotas do cinema, com interessantes posicionamentos de câmera que fogem a uma maneira padrão de filmar, Safadi utiliza uma edição de som que chama mais atenção do que as imagens, uma falta de equilíbrio que parece enfraquecer certas sequências mais fortes, além de ir e voltar no tempo, maneira pouco eficiente de narrar uma história.

"Cru" começa ressaltando sua origem de peça teatral; possui diálogos rápidos e inteligentes, lembram talvez Tarantino no sentido de evitar falar diretamente sobre a trama, desenvolvendo ideias sobre assuntos paralelos. A base de sua força dramática está na atuação. No entanto, o filme parece não crescer além desse ponto; até perto do fim é essencialmente uma obra de atores e situações que possuem carga dramática pelo que é dito, e não através das imagens.

Em cena, dois homens convesam; um paga ao outro para que mate um certo homem maldito. A tensão cresce ao ponto de revelações melodramáticas. No último ato, mudanças bruscas operam modificações duras nos personagens. O filme adquire atmosfera sombria, mostra uma violência que embora seja visível na tela parece doer mais no coração. Ao mesmo tempo, Jimi demonstra habilidade para a edição, criando uma tensão entre o tempo e o espaço em que as ações são encenadas, de maneira discreta e eficaz.


*Viagem a convite do Cine BH

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