sexta-feira, 26 de outubro de 2012

História de amor e política


Hugo Viana*


BELO HORIZONTE (MG) - No mercado atual do cinema independente o diretor português Miguel Gomes vem, através de seus dois últimos longas-metragens, estabelecendo-se como um dos realizadores mais especiais. Depois do belo "Aquele querido mês de agosto" (2008), o Cine BH apresentou na segunda à noite "Tabu", vencedor do prêmio de crítica do Festival de Berlim deste ano.

O filme é exemplo elaborado de melodrama de coração doloroso, gênero que geralmente é criticado por falta de originalidade. "Tabu" parece escapar desse argumento usando métodos do cinema contemporâneo, um tipo contemplativo de cinema, e uma combinação de imagens em preto e branco e edição de som que remete ao período do cinema mudo.

É um filme que sugere nostalgia ao cinema do passado, ao modelo de cinema praticado nos anos 1920, mas ao mesmo tempo consciente de métodos contemporâneos de captação e construção de imagens. O diferente uso de películas (35mm e 16mm) não apenas torna as imagens ainda mais sedutoras, mas especialmente parece elevar a carga sentimental do enredo. 

O filme é dividido em duas partes; a primeira se chama "Paraíso Perdido", seguida por "Paraíso". Na primeira temos três personagens principais: as senhoras Pilar, sua vizinha Aurora e a empregada desta última, Santa (as três igualmente ótimas). O segundo trecho narra a juventude de Aurora, na África. Além disso, há uma abertura que, com rara beleza, apresenta o sentimento geral da história, com humor e grande coração.

O filme é uma homenagem ao cinema do passado, especialmente ao diretor alemão F.W. Murnau - o título é o mesmo de um longa de Murnau de 1931, além de a personagem principal ter o mesmo nome de outro filme do diretor alemão (1927), também uma sofrida história de amor. Mas além dessa dimensão cinéfila, o filme se sustenta como autêntico melodrama, a história das dores de um amor impossível, filmado com criatividade e exuberância.

O filme tem um humor muito sutil, uma espécie contida de comédia sobre relações humanas, ao mesmo tempo em que insere dramas existenciais. Destaque para a narração (feita pelo próprio diretor), um texto de muita sensibilidade, que sugere ligações com “As pontes de Madison”.

O filme tem ainda uma dimensão política curiosa: comenta discretamente o estado atual de Portugal ao mesmo tempo em que observa o passado colonialista, a dominação sobre países africanos e os modos de permanência de um sistema político baseado na hierarquia da cor e do dinheiro.

*Viagem a convite do Cine BH

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