terça-feira, 23 de outubro de 2012

Registros afetuosos em baixo orçamento















Hugo Viana*

BELO HORIZONTE (MG) - Festivais de cinema geralmente possuem duas metas ambiciosas: apresentar novidades do mercado contemporâneo e recuperar a memória do passado. Esta sexta edição do Cine BH oferece duas retrospectivas que acertam essas propostas. A primeira é do cineasta francês Leos Carax, 51 anos, mais conhecido por “Sangue Ruim” (1986) e “Os Amantes da Ponte Neuf” (1991). A outra é curiosa: exibição de todos os sete filmes do diretor mexicano Nicolás Pereda, 28 anos, obras exibidas, entre outros festivais, em Cannes e Veneza, importantes eventos do mundo do cinema.

“Meus filmes não são simples e monumentais, como os de Béla Tarr ou os de Tarkóvski. Meus filmes são simples e simples”, diz o diretor. Pereda conversou com espectadores do Cine BH e demonstrou conhecimento de cinema, explicando seus métodos de trabalho - uma espécie artesanal de teoria de cinema, que busca inspiração na realidade, ficcionalizando o cotidiano - com um tipo natural de humildade.


Nicolás é formado em cinema nos Estados Unidos, onde atualmente mora: recentemente ele recebeu uma oferta para permanecer na importante universidade Harvard para pesquisar e, se preferir, filmar um novo projeto. “No México existia apenas duas boas faculdades de cinema”, lembra o diretor. “Eu não consegui entrar em nenhuma.”

Pereda chamou a atenção do mercado ao vencer, em 2007, o Morelia International Film Festival. “Quando comecei a filmar mandei meus filmes para todos os festivais que existiam. Depois descobri que o trabalho de um júri é muito aleatório. Cada júri tem um gosto diferente. Tive sorte que um júri americano com gosto estranho premiou meu filme”, explica o realizador.

Os filmes de Nicolás são parecidos uns com os outros e com pouca coisa no cinema contemporâneo. Pereda usa ferramentas do documentário em enredos de ficção; são obras contemplativas, em que emoções fortes e humor são recorrências sutis. Quase sempre são protagonizados por Gabino Rodriguez e Tereza Sanchez, amigos do diretor. “Gosto de trabalhar com atores não-profissionais. Gabino é ator, mas antes disso é meu amigo. Ele não decora falas, constantemente improvisa, enquanto Tereza, que não é profissional, segue o roteiro. Gosto dessas forças diferentes, isso mantém o imprevisto na filmagem”, analisa.

O filme mais recente de Nicolás é “As melhores canções”, que possui com a música um encantador vínculo emocional. O diretor explica que o título não apenas recorre a músicas românticas para explicar partes do enredo - a ruptura familiar e uma certa procura por amor -, mas também remete aos álbuns de “maiores sucessos” de uma banda. “Esse é como se fosse meu ‘maiores sucessos’. Neste filme o espectador encontra a compilação de todos os filmes que fiz”, ressalta.

“Meus filmes são baratos. Filmamos em locações que conheço, casas de amigos”, comenta Nicolás.  “É estranho fazer um filme com orçamento de U$ 400 mil, como em ‘As melhores Canções’. É um filme que se parece com meus anteriores porque eu decidi que, agora que recebo dinheiro, vou pagar adequadamente todos que me ajudaram no passado, e não mudar a maneira de filmar”, ressalta.

“Nos últimos seis ou sete anos o circuito exibidor do México mudou”, diz Pereda. “Abriram mercado para filmes pequenos e estranhos, europeus e latino-americanos. A Cinemateca mexicana exibe filmes europeus importantes junto com obras latino-americanas menos conhecidas. Um filme meu tem em geral 10 ou 15 mil espectadores, o que é relativamente um público pequeno, mas para mim é fantástico. Eu faço filmes com quatro amigos, em duas semanas. Então esse público é ótimo”, comenta.

*Viagem a convite do Cine BH

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