quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Violência extrema e sem propósito


Hugo Viana


Filmes com quantidade extra de violência costumam causar polêmica. Po isso, é bom avisar aos espectadores que preferem não ver corpos sem pele, pedaços de cérebros espalhados no chão ou o efeito devastador de balas tamanho G no rosto humano, em câmera lenta, que "Dredd 3D", dirigido por Pete Travis, talvez não seja o programa adequado.

Este remake, sem qualquer vínculo com o original de 1995, é autêntico filme de ação - enredo mínimo, como os suspenses de John Carpenter ("Assalto à 13ª DP", de 1976, parece referência) e tensão o suficiente para prender a respiração e segurar firme na cadeira. A história ocorre num futuro em que efeitos da radiação modificaram a geografia norte-americana, transformando o país numa cidade gigante. A violência social é controlada por "juízes", policiais que têm autonomia completa de decisão sobre certo e errado.

Como geralmente acontece em filmes com futuro distópico, os inimigos são traficantes que tentam dominar a cidade com um novo tipo de droga. A chefe é MaMa, mulher que estreou no crime desfigurando a anatomia sexual de um chefão com a boca, e depois continuou matando com prazer violento todos os integrantes das gangues rivais. Ao mesmo tempo, em toda sua capacidade brutal, MaMa é tão violenta quanto os juízes, os supostos heróis.

Nesse sentido, por tratar de um tema político, o filme expõe um tipo polêmico de ideologia: apresenta policiais com armas destruidoras e que têm o poder de julgar imediatamente criminosos, definindo quem merece prisão ou a morte imediata. Esse tipo de estado crítico é apresentado como normal, esses "juízes" são tratados como vencedores carniceiros; o filme parece ignorar que a existência de um sistema assim sugere abandono total de sentimento, o que aparenta ser um certo despreparo moral para o poder de sugestão do cinema.

Na verdade, é curioso sequer existir caos social nessa realidade vigiada por essa equipe policial; em meia hora de filme, dois juízes matam, na área de maior índice de criminalidade, mais de 50 bandidos, sem um arranhão qualquer. Poderiam poupar filme e encerrar a carreira criminosa de todos os bandidos da cidade sem muito esforço.

É um tipo de violência estilizada que atualiza de maneira irregular o cinema de Sam Peckinpah, diretor de faroestes brutos nos anos 1970 que através do recurso da câmera lenta nas mortes parecia interessado em observar os efeitos físicos e morais da violência; em "Dredd 3D", existe apenas o prazer sádico de filmar sangue e dor, a impressão de que a resposta para revolta social é matar, prática moral duvidosa. 

É uma pena que "Dredd 3D" funcione exclusivamente como filme de ação, uma produção claramente bem feita do ponto de vista técnico, especialmente os efeitos visuais e a edição sonora (o recurso 3D, aparentemente de pouca utilidade, mostra seu real valor numa das cenas mais violentas, quando, sob efeito da droga, que faz tudo ficar em câmera lenta e com um intenso filtro de cores, as mortes parecem ainda mais brutais), mas ao mesmo tempo retirando qualquer responsabilidade social, demonstrando indiferença sobre a necessidade de refletir sobre a própria realidade criada.

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